domingo, 24 de junho de 2012

O Assassino e a Donzela


Muito bom o artigo que reproduzo abaixo. Mauro Malin faz uma exposição didática sobre dois episódios recentes, que ajuda a compreender o que se passou no Brasil de 50 anos para cá. Uma reflexão sobre as verdades que aos poucos vão emergindo.
Curiosamente, os protagonistas são um assassino e uma torturada. Remete ao excelente filme de Roman Polanski, "A Morte e a Donzela", quando confronta (lá fisicamente) o torturador, que violentou a personagem interpretada por Sigourney Weaver, que carrega o trauma por toda a vida. O torturador era o médico que dava assistência aos torturadores executores e, no uso das funções, a estuprou (ela tinha os olhos vendados). O filme de Polanski se passa em um país da América do Sul, sob as ditaduras sangrentas que se mantiveram mediante torturas e assassinatos.

COMISSÃO DA VERDADE

Relatos de torturada e de matador

Por Mauro Malin em 23/06/2012 na edição 699
Folha de S. Paulo publicou na sexta-feira (22/6) depoimento da hoje presidente da República Dilma Rousseff ao Conselho de Direitos Humanos de Minas Gerais, em 2001, parcialmente divulgado no domingo (17/6) pelos jornais Correio Braziliense e Estado de Minas. Dilma relatou com muita lucidez, em linguagem objetiva, o que sofrera trinta anos antes.
O material ganhou na Folha edição à altura de sua importância [ver abaixo]. Tem consistência para ser ponto de partida de novas pesquisas e reportagens sobre a repressão e as organizações que travaram o que Jacob Gorender definiu como Combate nas Trevas.
Lucia foi covardemente assassinada   
No Globo, o repórter Leonêncio Nossa, do Estado de S. Paulo, é entrevistado a respeito de seu recém-lançado livro Mata! O major Curió e as guerrilhas do Araguaia. Leonêncio pesquisou durante dez anos (ver “Um mergulho no último suspiro da guerrilha“). Teve acesso ao arquivo de Sebastião Rodrigues de Moura, o major Curió, um dos oficiais do Exército que participaram da repressão ao movimento guerrilheiro do PC do B e do massacre de seus integrantes. Leonêncio fez questão de só publicar aquilo que pôde confrontar com depoimentos de outros personagens (fez 150 entrevistas).

Uma falsa “guerra”
O material que se vai revelando após a sanção da Lei de Acesso à Informação e a constituição da Comissão da Verdade reforça duas constatações.
Primeira, que não houve “guerra” anticomunista, ou antirrevolucionária, como pretendem militares da reserva (e da ativa) para desculpar crimes contra os direitos humanos, e sim terrorismo de Estado contra pessoas presas, dominadas, indefesas. Voltaire começa o Tratado sobre a tolerância com a seguinte reflexão (em tradução livre do francês):
“Esquecemos rapidamente a multidão de mortos em inumeráveis batalhas, não só porque isso é uma fatalidade inevitável da guerra, mas porque os mortos pelas armas poderiam matar também seus inimigos, e não morreram sem se defender. Sempre que o perigo e as condições são iguais, o espanto cessa, e própria piedade se enfraquece. Mas se um pai de família é posto nas mãos do erro, ou da paixão, ou do fanatismo; se os que decidem sobre sua vida não se arriscam, ao decapitá-lo, nada além de ter cometido um erro; se podem matar impunemente por uma decisão administrativa, então o clamor público se eleva. Cada um teme por si mesmo. Vê-se que ninguém sente sua vida em segurança diante de um tribunal erigido para velar pela vida dos cidadãos, e todas as vozes se unem para pedir vingança.”
Diferentemente do que constatava Voltaire na Toulouse do século 18, não houve e não há no Brasil pedidos de vingança. Mas isso não retira um pingo da importância de se apurar, de acordo como diferentes relatos e documentos, o que aconteceu. E de extrair dessas narrativas um sentido que ajude os atores sociais a enfrentar seus desafios políticos. Hoje – para, por exemplo, erradicar a tortura em delegacias policiais e as execuções – e no futuro.
Segunda constatação, que a mídia, conjunto heterogêneo de olhares e vozes da sociedade, hoje parceira da Comissão da Verdade e sua antecessora na tarefa de buscar os fatos e torna-los públicos, a sucederá nessa tarefa durante longo tempo.

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“Encarei a morte e a solidão”, diz Dilma
Paulo Peixoto # reproduzido da Folha de S.Paulo, 22/6/2012

Num depoimento de 2001, mas só agora divulgado, a presidente Dilma Rousseff relata detalhes sobre sua prisão aos 22 anos, ameaças e a tortura a que foi submetida na ditadura militar (1964-1985). Ela fala em medo, dor, choques, palmatórias e as marcas que ficaram disso tudo.
Entre as ameaças, cita uma encenação de fuzilamento e frases como “você vai ficar deformada”, “ninguém vai te querer”, “vai virar presunto”.
O relato foi feito ao Conselho dos Direitos Humanos de Minas Gerais, num processo para que ela pudesse ser indenizada em R$ 30 mil pelo Estado. Parte do teor foi divulgado no domingo pelos jornais “Correio Braziliense” e “Estado de Minas”.
“O estresse é feroz, inimaginável. Descobri pela primeira vez que estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando a minha pele tremeu”, diz ela.
Leia a íntegra:

terça-feira, 12 de junho de 2012

Gentileza Revolucionária

Este Homem é José Dirceu. Se você tem menos de 40 anos, não costuma ler fontes diversas ou livros da história contemporânea, é provável que nunca tenha ouvido falar nele antes de 2003.

José Dirceu ou Zé Dirceu foi um jovem idealista. Liderou o movimento estudantil na ditadura sanguinária - que se instalou no Brasil em 1964 - que fechou o Congresso, deu carta branca para o sequestro, a tortura e a morte de opositores.

Dirceu sempre foi uma espinha na garganta dos militares golpistas , associados às elites endinheiradas, às empresas multinacionais e ao comando dos EEUU. Gostariam de tê-lo apanhado, tê-lo torturado até a morte.

 O líder estudantil foi salvo por meio da ação das organizações que fizeram sequestros de embaixadores para trocar por companheiros que se exauriam nos porões clandestinos de tortura, mantidos pelo Estado. Em 1969, o  MR-8 e a ALN sequestraram o embaixador dos Estados Unidos e exigiram a libertação de prisioneiros constantes de uma lista,  salvando-os da morte certa. Entre eles estava José Dirceu, um jovem de 23 anos.

Retornou para o Brasil clandestinamente, em 1971, com o objetivo de continuar na luta. Depois da anistia participou da fundação do PT e deu início à carreira política dentro da legalidade. Uma frágil democracia, que até hoje ainda se reconstrói dos escombros, sob o manto da impunidade dos que impingiram o Estado de Terror no Brasil. Um tapete de silêncio ainda encobre fatos que marcaram o período da ditadura.

 Foi deputado constituinte, quando se estabeleceu a Constituição Cidadã de 1988. Também foi artífice da candidatura Lula.  Dirceu é odiado por nunca ter-se curvado. As ocorrências durante o governo Lula são marcadas pela hipocrisia. Aquela mesma que pauta a mídia, quando tenta esconder a Privataria Tucana.

As privatatizações realizadas pelo governo do tucanato foram um gigantesco esquema de caixa dois. O nome é este mesmo, a corrupção maior é decorrente desta indignidade. É o maior já existente na história. Documentos em profusão provam a existência do esquema da privataria tucana. Antes disso, há o canal que abasteceu o pseudo mensalão, que, como todos sabem, foi o valerioduto. Quem montou o esquema, com muitos milhões de dólares, foi o governador de Minas Gerais, o tucano Azeredo. O canal era o caixa dois da campanha do tucanato nacionalmente.

Voltando a José Dirceu, o Zé Dirceu, eu o reconheço como um homem que lutou e que continuou a lutar mesmo depois das torturas. Um homem que teve todas as oportunidades do mundo para abandonar a luta pela reconstrução do País. Ao contrário de muitos, ele nunca mudou de lado.
Enquanto houver o sistema eleitoral montado pelas elites oriundas da ditadura, a corrupção não acaba. Façamos a Reforma Política. Construída por meio de ampla consulta popular e não pelas velhas raposas.

Leila Jinkings. Recife, 12 de junho de 2012.

Bem a propósito, sobre o que escrevi acima, assista a hilária e estarrecedora entrevista de Ciro Gomes.

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domingo, 3 de junho de 2012

Jornalismo e... jornalismo

Vamos falar sobre liberdade de imprensa?
Mas leiam antes sobre o assunto, informem-se. Ou estarão sendo manipulados desavergonhadamente.

Deixo este vídeo muito interessante e didático, que ajuda a esclarecer as estratégias de dominação. Aproveitem a oportunidade.

Troféu "óleo de peroba" para Alexandre Garcia, que nem "sentiu a ditadura".





Este vídeo mostra o que se esconde por trás dos ataques sistemáticos da mídia brasileira contra a presidenta da Argentina, Cristina Kirchner. Para entender o jogo da mídia contra o que chamam de "kirchnerismo" é importante contextualizar a situação. Antes, vamos usar uma analogia metafórica. Você mora numa grande cidade em que três padarias controlam a qualidade, a variedade e o preço dos pães que você consome. E uma antiquada lei diz que só os políticos podem liberar concessões para novas padarias. E a maioria dos políticos (responsáveis pela tal lei) são donos das padarias; ou amigos destes; ou representantes dos mesmos. Daí, um governante assume a responsabilidade para criar uma nova lei que visa quebrar o cartel, dificultar o monopólio e facilitar o surgimento de novas padarias. O que faz o sindicato dos donos das padarias? Começa a espalhar panfletos dizendo que o governante quer controlar a produção de pães na cidade e ameaça a sua liberdade de escolher o pão que você vai comer. Agora, imagine se, em vez de mandar imprimir panfletos, os donos das padarias fossem donos de todos os meios de comunicação (jornal, rádio, tv etc) disponíveis. E tente imaginar se, em vez de pãezinhos, os produtos em questão fossem as notícias que influenciam a vida todos na cidade. Uma vez exposta esta metáfora, vamos conhecer um pouco a história da imprensa na Argentina para entender o que isto tem a ver com o Brasil.

BRASIL NUNCA MAIS

BRASIL NUNCA MAIS
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